02 D E A B R I L

domingo, 26 de janeiro de 2020

TECNOLOGIA E AUTISMO

Tecnologia é forte aliada para o desenvolvimento de pessoas com autismo
Nesta segunda-feira, 2, Dia Mundial da Conscientização do Autismo, o blog fala com pais e especialistas sobre como aplicativos, softwares e outras ferramentas que podem auxiliar no dia a dia delas.
Tablets e celulares são muitas vezes usados porque podem facilitar o aprendizado das crianças autistas com estímulos visuais. Foto: Pixaby
Quando Felipe tinha 1 ano e 7 meses de nascido, seus pais, Paula Lima Porta, de 40 anos, e Claudio Roberto Porta, de 45, receberam o diagnóstico de autismo para o filho. “O autismo, ou Transtorno do Espectro Autista (TEA), é identificado por déficits ou falhas na comunicação social e interação interpessoal e por comportamentos, interesses e atividades repetitivas e restritas”, explica a psicóloga Sarah Helena. Antes de receber a notícia, Paula diz que percebia que Felipe “não construía a fala, era muito quieto, não interagia, não brincava, mas em compensação gostava muito de eletrônicos”. Após o diagnóstico, houve negação por parte do marido. E ela foi à luta.
Hoje com 4 anos, Felipe tem uma rotina intensa, que inclui 18 horas de terapia semanal, 2 horas de natação, além de escola, fono, terapia ocupacional, entre outras atividades. “Ele adora nadar, jogar bola, e gosta de brincar com o Dumbo, nosso cachorrinho”, diz a mãe. E, aliada a tudo isso, está a tecnologia, “como um incentivo para acordar cedo, esperar a hora de entrar na escola, comer, fazer as atividades na terapia, e também de incentivo, para enfrentar eventos sociais”, detalha Paula. Para isso, a família conta com a ajuda de aplicativos infantis, como o PlayKids, que é voltado para educação.
“Por exemplo, existem alguns vídeos que ensinam os pequenos a exercitar atividades do dia a dia, como tomar banho, pentear os cabelos e até escovar os dentes. O que parece uma tarefa fácil, para um autista pode ser um grande desafio”, afirma Paula. “A tecnologia também trouxe para ele ganhos na fala, facilidades na alfabetização, além de ser uma facilitadora nas interações entre ele com o mundo, pois uma das dificuldades dos autistas muitas vezes é sair de casa e ter essa relação, e com a tecnologia e a internet, conseguimos trazer o melhor dos mundos: ele consegue evoluir e investir nesse tipo de relação seguindo o próprio ritmo.”
Felipe e a mãe Paula. Foto: Arquivo pessoal
A psicóloga Sarah Helena é curadora do Playkids. De acordo com ela, as plataformas digitais tanto quanto as brincadeiras devem sempre andar juntas e promover momentos de união entre a família. “Os vídeos e os desenhos infantis, por serem atrativos aos pequenos, podem ser um meio de aproximar pais e filhos, desde que assistam juntos, comentando e compartilhando suas impressões sobre o conteúdo.”
Especialista em tecnologia, Breno Masi, diretor de produto do aplicativo, afirma que tablets e celulares são muitas vezes usados porque podem facilitar o aprendizado das crianças autistas com estímulos visuais. “Com o PlayKids, por exemplo, é possível acessar vídeos que ensinam coisas como comer, usar o banheiro e fazer a higiene pessoal, além de tornar disponível atividades que estimulam a alfabetização. A absorção dessas informações pode ser complexa para algumas dessas crianças, por isso o uso dos aparelhos visuais tende a facilitar o processo.”
Pai de Romeo, de 12 anos, que tem autismo, e um dos principais porta-vozes da causa, o apresentador Marcos Mion afirma que não só tem certeza que a tecnologia ajuda, como quem cria a tecnologia, muitas vezes o faz para ajudar pessoas especiais. “Inclusive, existem empresas que deixam a tecnologia à disposição, de graça, para crianças especiais e assumem como uma diretriz da empresa por saberem o quanto apps e tablets em geral são uma ferramenta única que conecta as pessoas do espectro autista com o mundo”, relata Mion, que, em 2016, lançou o livro A Escova de Dentes Azul, inspirado nas lições que aprendeu na convivência com o Romeo.
“Muitas vezes, a criança no espectro tem dificuldades de comunicação. Não consegue falar. E não são poucos os casos onde as primeiras frases da criança com autismo saem por repetição de filmes, jogos ou aplicativos. Me refiro amplamente sobre tecnologia. Incluindo as mais ‘antigas’ como filmes, DVDs”, diz ele.
Romeo e Marcos Mion. Foto: Marcela Barros
“Minha experiência pessoal comprova que o tablet, no meu caso o iPad, foi a forma do Romeo ‘existir’ em algumas formas. O que lhe deu a capacidade de se conectar com família e amigos por conta própria, por exemplo. Você pode imaginar o que é para uma criança que ainda está aprendendo a escrever poder ganhar o mundo para pesquisar, ouvir música, ver imagens e descobrir coisas com a ajuda da Siri?!? Sem contar a própria Siri ou a Alexa da Amazon com quem Romeo conversa por horas se deixar!”, conclui Mion, referindo-se a dois assistentes digitais que funcionam com comandos de voz. De acordo com o neuropediatra Clay Brites, do Instituto NeuroSaber, existem pesquisas, inclusive no Brasil, que mostram que a adoção de determinadas tecnologias auxilia na aprendizagem escolar e nos recursos didáticos para inclusão na escola de pessoas com autismo.
“A tecnologia pode auxiliar no dia a dia por meio de softwares que ajudem quem tem autismo a conseguir cumprir tarefas sociais, entender linguagem não verbal, serem alfabetizados, aumentar a motivação ou interesse por atividades pedagógicas ou acadêmicas, internalizar rotinas e regras, auxiliar na percepção do tempo e do espaço, proteger de sons ou estímulos visuais indesejados, além de acalmar determinados jovens com autismo quando estes devem se dirigir a estabelecimentos comerciais ou momentos de lazer em família entretendo-os.” E Brite reforça a importância de um diagnóstico precoce.
“É essencial e imprescindível para que sejam realmente modificáveis os atrasos de desenvolvimento e os comportamentos altamente disruptivos e antissociais. Somente em fase mais precoce de vida (antes dos 3 anos), com o cérebro infantil ainda em plena fase de plasticidade e flexibilidade de conexões e ramificações, é que é possível esperar avanços significativos às intervenções”, alerta. “Além do mais, deve-se fazê-los cedo para que a criança possa ter a oportunidade de adquirir habilidades nas idades em que ela precisa aprendê-las.”
Para seu filho Felipe, Paula deseja um futuro feliz, numa sociedade mais inclusiva. “Quero que ele seja feliz e que seja o melhor que ele puder, porque ele é muito inteligente e com muito amor na sua essência (não tem como não se apaixonar por ele). Acredito que ele vai se dar bem, pois é muito amoroso, sincero e focado. Ele realmente vive o momento presente, algo que falta muito para nossa sociedade.” 
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